Nesse último sábado, dia 25/03/2017, realizamos nosso 17º encontro aqui na capital cearense. Sobre essa edição deixo aqui o fantástico texto do sketcher Fabrício Porto e, logo abaixo, os desenhos da(o)s querida(o)s USKs cearenses. Valeu demais, galera!
ANALISTAS DE MERCADO
Salvo pelos contornos elevados de
edifícios à distância, o entorno do Mercado dos Pinhões lembra uma
singela praça do interior nordestino, mesmo
com aquela arquitetura de época, importada, no meio. Passantes pacatos,
de lá para cá resolvendo questões de seus comércios ou residências com
vizinhos receptivos, vendedores de frutas, um ciclista ou outro, árvores
com vira-latas à sua sombra e muito pouco do nefasto ruído urbano das
grandes esquinas aldeotinas*. Foi este o cenário do 17º encontro do Urban
Sketchers Fortaleza: uma bucólica atmosfera interiorana.
Dezenas de desenhistas urbanos, espalhados em frente à estrutura
metálica como muçulmanos na Meca chamavam a atenção dos transeuntes
habituais, talvez pouco acostumados àquela atenção toda ao objeto
central da praça, o mastodôntico coreto verde, capaz de abrigar tanto
carnavais como feiras de fruta. 'Estão desenhando', ouvia-se ao pé do
ouvido entre pares no comércio próximo, como quem identifica um saber
enigmático. 'São artistas', sentencia outro, conferindo caráter
demiúrgico aos desenhistas. Indiferença é a única postura não percebida
pelos que ali observavam a cena.
A boa arquitetura é magnética.
Nenhum dos desenhistas ousou desenhar outra coisa que não fosse o
próprio mercado. Salta aos olhos, principalmente estando inserido num
entorno de fachadas improvisadas e muros de terreno baldio. Para lá
viraram-se os olhares, para geometrias circunscritas umas dentro das
outras, para o ritmo das finas colunas, para os vidros gema e lilás que
brigam com o verde desbotado do conjunto, para a transparência das
grades que revelavam o outro lado, para o arremate triangular apontando
os céus. Numa só peça, assentada com os devidos recuos que a permitam
respirar visualmente, incontáveis detalhes fazem os desenhistas
dedicarem o tempo de Zeus, o tempo contemplativo, das horas eternas, que
passam na mente, para decifrá-la.
O redator desta crônica de um
dia atípico naquele fragmento urbano não desenhou o mercado. Por teima
ou por não ter bom ângulo a partir de onde tomava uma cerveja
salvacionista naquele momento de calor insurpreendente, desenhou a praça
em frente ao mercado, representando deste apenas uma única coluna, para
fins de contexto. A boa conversa, as digressões sobre o desenhar e a
ocupação da mão pelo copo estenderam o desenho por mais tempo que o
habitual. Junto à saciedade da cerveja agressivamente gelada e da
companhia dos parceiros de ofício, a satisfação de registrar uma janela
de tempo agradável em foto, em texto e em desenho.
* Referente à Aldeota, bairro fortalezense conhecido, entre outras coisas, pelo intenso fluxo viário.
Fabricio Porto, 25 de março de 2017.
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