Numa tarde na Praça
Generoso Marques, Curitiba, este croquiseiro dará continuidade a sequência de
desenhos solitários no entardecer de horário de verão, desta vez ficará de costas para o Barão do Rio
Branco.
Ele quer relaxar, se distanciar
do dia que termina, entrar na poesia dos desenhos e habitar por alguns
instantes um paraíso que o anestesia com muito prazer.
A composição desta vez
envolverá dois prédios ecléticos que foram preservados e que agora atendem às
demandas de um supermercado e um restaurante self service.
Ao fundo, dois prédios
modernos, que ironicamente já são ruínas.
Um deles com pedigree e autoria de comprovada fama. O outro um daqueles
espigões abandonados pelos profissionais da especulação imobiliária e que se
tornou tela de grafiteiros e pixadores.
O croquiseiro começa a
desenhar e não sabe que na verdade ele é o tema principal para alguns
passantes.
O primeiro passante celebra
a ação artística, puxa uma conversa que também desenha, mas que devido às
demandas da vida o faz apenas uma vez por ano.
Diz que tem um estilo "diferente" e retira o celular e mostra uma
foto de sua última obra: "O dezfarce". Sim, são dez faces em perfil entrelaçadas,
que se escondem uma das outras. Dez
faces que não parecem nenhuma, uma camuflagem em forma de dezena. Companheiros artistas se reconhecem nas busca
de uma poesia gráfica. Refletem e
discutem que não é possível viver sem desenhar, a vida se tornaria uma
insuportável monotonia.
Eis que se aproxima aquele
homem de cabelos longos, um "alemão queimado", aturdido e de olhos
verdes, quase saltando do rosto. Começa
com uma conversa incompreensível mas que pelo entusiasmo transmite uma
admiração pelo trabalho. Novamente
parece que a poesia gráfica conquistou mais um, pensava o croquiseiro. Mas daqui
a pouco o passante faz uma
proposta: ele gostaria que o croquiseiro desenhasse o seu filho. Reconhecendo o padrão da conversa, o
croquiseiro já se prepara para dizer que não será possível atender aquele pedido,
naquele momento. Mas o passante insiste:
— Você poderia
desenhar o meu filho? Eu o enterrei faz sete dias.
O croquiseiro se
comove pois vê a razão para os olhos esbugalhados do passante: choro, saudade e
provavelmente uma busca pela visualização do filho. Ele adianta que não tem uma
foto, mas espera que o croquiseiro possa captar a imagem por alguma ação
paranormal, já que ele é um artista. O
croquiseiro fica abalado, pois percebe que o ato de desenhar para alguns é também
uma especie de habilidade mágica, quem sabe paranormal ou divina. O croquiseiro é tomado de emoção, e é forçado
a responder ao transeunte que não tem este poder. Mas o transeunte insiste e aí, faz outro
pedido:
— Você é capaz de
desenhar a pessoa que matou o meu filho?
O croquiseiro não
responde, não tem palavras nem traço para lidar com tamanha rogativa. O passante desiste e se despede com saudações
cordiais apesar de decepcionadas.
Depois disto cada
textura do prédio passa a ganhar um significado maior para o desenhista,
prédios abandonados e desejos por uma conexão gráfica com o filho morto parecem
ser a mesma coisa.
Dor e desejo por
alguma justiça de fim de tarde.
Poderes paranormais ? Talvez. Mas tremenda sensibilidade sabemos todos que esse croquiseiro tem ...
ResponderExcluirAdorei a excelente postagem! Texto, desenhos e imagens... paranormal mesmo! Muito sensível e mais urbano do que isso... #sktechcronicaurbana! As imagens do "bigbrother" foram fundamentais para dar o tônus da presença da dinâmica urbana. Parabéns José Marconi!!!
ResponderExcluirRealmente as fotos deram todo o contexto para se entender
ExcluirÉs um bruxo!! Retratar essas características decadentes desses prédios só tento um sensibilidade fora do serio.Lindos desenhos!!
ResponderExcluirExcelente texto. Realmente muitos pensam que é mágica, quando eu falo em treinar, treinar e treinar (leia-se desenhar, desenhar e desenhar rsrs) as pessoas ignoram e continuam dizendo: " realmente é um dom..." rsrs
ResponderExcluirObrigado por compartilhar, belissimo texto!
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